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Sedução e Sedutores

Don Juan e Casanova são exemplos clássicos de sedutores inquietantes, bem falantes e mal pensantes que precipitam as senhoras no mau caminho. Hoje, no mundo das SMS, da Internet e de outras tecnologias, existirá ainda lugar para sedutores?

Terá o sedutor desaparecido da nossa sociedade tendencial e se­xualmente igualitária? Não me parece. Aliás, a curta duração de muitas relações, que morrem nas suas fases mais iniciais, comprovam o domínio do reino da sedução.

Em 1995, o filme Don Juan Demar­co, de Jeremy Leven, interpretado por dois grandes sedutores do cinema, Marlon Brando e Johnny Deep, veio reanimar o persona­gem literário de Don Juan, tido como símbolo de sedução e liber­tinagem. Este personagem, cuja existência real ainda hoje é discu­tida mas largamente representada nas mais variadas formas de arte, procura representar um padrão de personalidade narcísica, sem escrúpulos, amada e odiada e que não olha a meios para conquistar uma mulher. Curiosamente, este protótipo não é descrito para o sexo feminino – tido sempre co­mo vítima do sedutor, ainda que muitas mulheres sejam mestras na arte de seduzir.

Triunfo da conquista. Actual­mente a referência ao Don Juanis­mo serve para caracterizar uma situação que muitas vezes se torna patológica para o sedutor e para aqueles com quem ele se relaciona. Trata-se de uma forma de estar caracterizada por uma forte com­pulsão para a sedução de alguém que procura enamorar-se da pes­soa mais difícil de conquistar para a abandonar em seguida. São pes­soas que não conseguem manter uma relação por muito tempo, partindo logo em busca de novas conquistas.

Para o Don Juan apenas interessa o instante do prazer e o triunfo so­bre a sua conquista, principalmen­te quando o alvo do seu interesse tem uma situação relacional e ci­vil proibida. É o aspecto do desafio que o mobiliza, fazendo com que a conquista amorosa tenha contor­nos de desporto e competição. O narcisismo destas pessoas é um aspecto que melhor as caracteri­za, ao ponto de se amarem muito mais a si mesmas que a qualquer outra pessoa.

Estes Don Juan não são obriga­toriamente mais viris ou sexual­mente activos. A sedução contínua nem sempre se dá à custa de um eventual desempenho sexual ex­cepcional, mas devido à habilida­de em oferecer sempre às mulheres aquilo que elas mais desejam. São, por isso, o protótipo do príncipe encantado, tão valorizado pelo sexo feminino desde a mais tenra infância, e têm a capacidade de perceber rapidamente os gostos e fraquezas das suas vítimas, sendo muito rápidos em satisfazer as mais diversas expectativas. Não é de estranhar, por isso, que as mulheres que se envolvem em ligações deste tipo saem muito magoadas e com uma profunda sensação de raiva e abandono.

Arte de seduzir. Para além da faceta negativa da capacidade de seduzir, geralmente instalada em personalidades imaturas, já o uso da sedução no dia-a-dia deveria ser uma arte a desenvolver e a aplicar com frequência, qualquer que seja a nossa condição. Muitos casais beneficiariam desta arte se a praticassem mais e melhor, que­brando assim rotinas maçadoras e espevitando relações mornas. O dia de São Valentim tornou-se na festa instituída para pôr em prática a capacidade de agradar ao outro, de lhe mostrar que nos importa a sua presença. É o amor com dia e hora marcada. Mas porque hoje nos casamos ou nos unimos a alguém por amor, sen­timento muito pouco racional, feito de ternura e sexo, a sedução está cada vez mais que nunca na ordem do dia.

O objectivo da sedução é obter a atenção da pessoa por todos os meios possíveis para conseguir o controlo emocional e criar uma fonte de prazer. As etapas e ri­tuais de sedução são universais, com poucas nuances, geralmente de natureza cultural. Por exem­plo, quer no mundo dos huma­nos como no animal, é sempre a fêmea que é o sujeito da sedução e o macho o sedutor. Mas o sedu­tor nem sempre é aquilo que julga­mos. Se um homem tentar sedu­zir uma mulher que não o queira, rapidamente compreenderá quem tem o poder no processo de sedu­ção. Mas quais são as famosas eta­pas de sedução?

Etapas da sedução. O primei­ro passo é prender a atenção do outro. Geralmente as mulheres valorizam os atributos físicos (ao contrário do mundo animal), enquanto os homens ostentam o seu poder e riqueza. Os homens exibem-se e as mulheres provo­cam. E vem o momento em que os olhares se cruzam. Se o olhar perscrutador do homem encon­tra o olhar receptivo da mulher, produz-se uma faísca repleta de promessas. Se a mulher sorri, revolve o seu cabelo com os dedos, o homem tem permissão para avançar. Caso contrário as suas hi­póteses são reduzidas. O olhar é o instrumento de sedução mais efi­caz no ser humano e tem o poder de decidir o sucesso ou insucesso de uma potencial relação.

A seguir há que iniciar uma con­versação. A naturalidade e curio­sidade em conhecer o outro um pouco melhor criam melhores probabilidades de gerar uma con­versação, cujo conteúdo até nem é muito importante. A manuten­ção do interesse do outro é extre­mamente importante e para tal temos que ser observadores, estar atentos, esquecermo-nos de nós. A conversação é o ponto de ruptura: a sedução passa ou acaba, o encan­tamento permanece ou parte-se. De acordo com os antropólogos, é geralmente a mulher que gera o primeiro contacto físico, através de um leve aflorar da mão com a mão, sempre de forma fortuita e ingénua, ainda que premeditada e calculada quanto aos seus fins. É aí que começa o verdadeiro teste às capacidades de sedução. Com este ligeiro toque foi dito “sim interes­sas-me, continua a seduzir-me.”

Reacender a paixão. A arte da sedução não diz respeito apenas àqueles que se querem envolver numa relação. Ela permite fazer durar um amor e reacender mo­mentos de paixão numa relação ameaçada pelo tempo e pelas crises.

A sedução e o amor necessitam de manutenção, no sentido de ha­ver uma ajuda mútua na satisfa­ção das nossas necessidades de afeição, crescimento pessoal, ne­cessidades sexuais, sonhos, pro­jectos conjugais. Em suma, a ser felizes.

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Novas famílias, novos papeis

As configurações familiares no início deste milénio são muito variadas e complexas. O casamento transforma- se em casamentos e muitas crianças experimentam duas vivências familiares distintas: a casa da mãe e a casa do pai.

As configurações familiares no fi­nal deste milénio são muito varia­das e complexas. Ao longo de uma vida é cada vez mais frequente “o casamento” transformar-se em “casamentos”. A família tradicio­nal transforma-se noutra de con­tornos maleáveis e dinâmicos. As crianças podem experimentar du­as vivências familiares distintas, a casa da mãe e a casa do pai. E os fi­lhos da nova união poderão ter ir­mãos residentes e irmãos de fim- de-semana… E todos acabam por desempenhar uma multiplicidade de papéis que algumas vezes não desejaram, ou sobre os quais pos­suem pouca informação.

Período crítico. A fase de transi­ção, da ruptura de uma célula fa­miliar à organização da nova es­trutura, é um período crítico, em que a definição das novas rotinas quotidianas, da gestão das emo­ções e dos medos e de encontrar o lugar de cada um na família se traduzem num esforço relacional e emocional que fragiliza todos os intervenientes. É neste período crítico que o nível de inseguran­ça emocional se acentua, como é de esperar nos processos de mu­dança. E as crianças são, infeliz­mente, os alvos preferenciais dos medos e angústias desencadeados pelas modificações profundas no seu universo socioafectivo.

Mas é sobre os adultos que gosta­ria de reflectir, pois a sua actuação pode ser determinante para que esta mudança resulte bem para as crianças, marcando a diferença entre uma “saudadezinha do pa­pá” ao adormecer, que se cura com um telefonema tranquilizante, ou o medo do abandono e do confli­to entre os pais que vão minando a tranquilidade dos mais novos. A verdade é que a qualidade da ac­tuação dos adultos depende muito da forma como gerem os seus pró­prios receios e fantasmas.

E se o novo companheiro não gosta das minhas crianças? Mui­tas vezes esta inquietação surge quando o convívio entre o novo parceiro e as crianças se intensifi­ca, nomeadamente quando come­çam a coabitar. A expectativa dos adultos em relação à intensidade dos laços afectivos é, por vezes, desadequada e origina respostas muito reactivas aos contratem­pos e ajustes que inevitavelmen­te surgem. Os afectos também se constroem e para isso é preci­so tempo.

Definir papéis. As mudanças abruptas são as mais violentas. Se já existem laços de convívio,se já pudemos observar a crian­ça a interagir com o novo compa­nheiro e gostámos do que vimos, talvez não haja motivo para gran­de inquietação. O planeamento é uma estratégia óptima para re­duzir a incerteza e os mal-enten­didos. Uma vez tomada a decisão de viverem todos juntos, é impor­tante que o novo casal se sente pa­ra conversar, definindo o papel de cada um, o exercício da autorida­de e do poder, as regras, as tare­fas, os limites a respeitar do es­paço individual. Principalmente, como agir em matérias susceptí­veis de serem fonte de desenten­dimentos — oportunidade que os mais novos geralmente aprovei­tam para “dividir para reinar” e obter coisas que de outra forma não teriam. Idealmente, e em sin­tonia com as idades das crianças, deveríamos ser capazes de dialo­gar com elas e torná-las parte in­tegrante deste processo.

Devemos deixar sempre claro pa­ra o outro o lugar que as crianças ocupam na sua vida e o quanto são importantes para si. Se o novo companheiro também tiver filhos, entenderá do que estamos a falar. Mas terá igualmente necessida­des, inquietações e expectativas relativamente aos seus próprios filhos. Um processo de negocia­ção intensa torna-se quase obri­gatório, nomeadamente enquan­to predomina o encantamento do enamoramento, que poderá facili­tar a conversa destes assuntos.

Conquista afectiva. Ser tole­rante perante uma situação que é nova para todos, onde ainda se en­saiam papéis e é natural que o ou­tro não seja perfeito, pode ser meio caminho andado para o sucesso. Para isso temos de esquecer a ten­dência generalizada entre muitos casais de fazer comparações com o “ex”, porque, apesar de desem­penhar funções parentais, o novo companheiro não é, de facto, o pai ou a mãe das crianças.

A madrasta má e o vilão também têm medos. O grande medo é ser considerado como um intruso que será rejeitado. Como tornar-se, en­tão, parte integrante da família? E se a criança não o aceita? Qual o impacto que isto vai ter na relação de casal? Estas inquietações con­tribuem para uma atitude hipervigilante, que, por sua vez, pode condicionar condutas muito reac­tivas em resposta a comportamen­tos infantis de oposição ou hosti­lidade. Estes comportamentos da criança são de esperar em qual­quer família — ainda mais numa estrutura familiar em mudança, na qual a criança ainda se sente insegura e até ameaçada — e po­dem ser interpretados numa pers­pectiva catastrófica em que é cer­to que “o miúdo vai-me odiar para sempre!”. Provavelmente a crian­ça está apenas a testar limites, ou a tentar perceber o que fazer com este tipo que, quer ela, quer even­tualmente outros adultos signifi­cativos no seu universo socioafec­tivo, responsabilizam por tomar o lugar do pai.

Conquistar estas crianças a qual­quer preço não é uma boa estraté­gia. A sedução “em esforço” não consegue ser sustentada por mui­to tempo e das duas, uma: a crian­ça sente-a como falsa e rejeita-a ou torna-se manipuladora em respos­ta à sua própria tentativa de ma­nipulação. Se encararmos logo à partida a relação com naturalida­de e com respeito, respeito por nós próprios, pela criança e pelos sen­timentos que necessitam de tem­po para amadurecer, então esta­remos a lançar as bases saudáveis para um bom relacionamento.

Direito de errar. O encontro dos sentimentos de medo da criança com as ansiedades e receios dos adultos tem que ser gerido pelo adulto. Somos nós que temos a capacidade de reflexão objectiva, que somos capazes de descentrar das nossas emoções, de sermos tolerantes e de transmitir segu­rança, de agir reflectidamente, com bom senso, ajustando as nos­sas expectativas e desejos às limi­tações e exigências da realidade, de auto-regular o nosso compor­tamento e, finalmente, exercer o poder. E como tudo isto não é fácil, temos também direito às fragilidades que habitam em to­dos nós e temos direito a errar! Não podemos é esperar que se­ja a criança a ter uma atitude ca­racterística de um adulto, mes­mo que estejamos a falar de adolescentes.

O papel do pai ou mãe é funda­mental para criar harmonia na nova família. São o seu compor­tamento e as suas atitudes que vão fornecer pistas às crianças do lugar do novo elemento na família, da sua importância, do que é e não é permitido. E é do diálogo entre o casal que nas­cem soluções criativas para as dificuldades que forem surgin­do. O grande truque talvez se­ja transformar potenciais con­flitos e agressões em problemas que necessitam de resoluções concretas. Porque este é o seu projecto e é pelo casal que a fa­mília existe.

 

Bebés. Levar um bebé para ca­sa do novo companheiro é uma situação que desencadeia medos profundos, tanto mais graves se estiverem associados a separa­ções conflituosas. Sentimentos de perda, rejeição e ciúme rela­tivos à ruptura do casal podem ser projectados nos filhos e no acto de os cuidar e partilhar.

A frustração ou sentimentos de impotência e abandono, comuns nas primeiras etapas do luto da relação, geram a necessidade de agredir aquele que “traiu” o projecto de vida a dois. Esta ne­cessidade leva a que se “instru­mentalizem” as crianças e que se façam muitas asneiras. Uma das tentações mais irresistíveis costuma ser criar aversão ao “ri­val” e ao novo lar. Ou enfatizar o distanciamento do outro pai co­mo uma troca, um abandono, sa­lientado as desvantagens de es­tar no “outro lado”.

Este tipo de estratégia tem nor­malmente dois resultados: a curto prazo a criança parece aderir e há uma recusa em estar com a “concorrência”; ou, a médio/longo prazo, se a pos­tura do “outro lado” for de to­lerância e amor, o feitiço vira­-se contra o feiticeiro. Há perda de relação e desvalorização de quem implementou esta estra­tégia. Entretanto, muito prova­velmente, viveram-se momen­tos dolorosos, alimentaram-se conflitos, criou-se desarmonia e sofrimento, pois atiçou-se o lu­me do caldeirão dos medos, dos adultos e crianças.

Contudo, devemos lembrar que ninguém pode ocupar o seu lu­gar no coração do nosso bebé, sermos o seu porto de abrigo. Ajudá-lo a enfrentar estes per­cursos com tranquilidade, não o sujeitando à violência das es­colhas impossíveis, é fundamen­tal, pois ele ama e necessita dos dois, mesmo que os dois já não sejam um.

Medos. Para neutralizar a an­gústia de não o termos sob a nossa asa protectora, devemos lembrarmo-nos de que quando escolhemos ou aceitámos ter um filho com aquele companheiro, com o qual podemos estar mui­to zangados, demos-lhe um vo­to de confiança como pai/mãe. Devemos lembrarmo-nos que o outro tem recursos que lhe per­mitiram tratar do filho conjun­to, e este precisa muito de estar com o pai/mãe em condições na­turais, em paz.

Nos pais que deixaram de viver com as crianças a tempo inteiro costuma observar-se uma ten­dência para espaçar os momen­tos de convívio com elas. Pare­ce uma reacção paradoxal, pois estamos a falar de pessoas res­ponsáveis e amantes dos seus fi­lhos. Mais uma vez, o medo tem um papel dominante na origem deste comportamento. O medo de não sermos competentes nes­te novo cenário, o medo da per­da de afecto, o medo da dor no momento da separação acciona mecanismos de defesa psicológi­cos, dos quais fazem parte a fu­ga. Ainda que fugindo ao con­fronto directo com a situação, o medo não desaparece, conti­nua lá, como que adormecido. De facto, conseguimos uma es­pécie de “alívio” imediato, mas a escassez de convívio continu­ado com os filhos acaba por tra­zer mais sofrimento e perda pa­ra nós e para eles.

O contacto com as nossas crian­ças tem um efeito psicologica­mente equilibrador. Ao vencer as primeiras etapas mais difí­ceis, a criança reafirmará o afec­to e a necessidade que tem de nós, confirmando o que sempre soubemos: que, para ela, nós somos insubstituíveis.

 Dicas para os pais:

  • Devemos ser previsíveis. Devemos evitar a todo o custo faltar aos encontros prometidos. Por, vezes as expectativas criadas são muito elevadas porque o pai ou a mãe vão estar presentes e os filhos precisam  de saber que podem continuar a contar com os pais
  • Se não pudermos de todo comparecer ao encon­tro devemos telefonar e explicar-lhe directamente a razão. Mas estas devem ser situações de excepção. É também importante deixar claro quando vai acontecer o próximo encontro.
  • Sempre que se despedirem, devemos referir “até sexta-feira!”,   para que a criança tenha uma referência concreta
  • Utilizar linguagem positiva leva-nos no reencontro, em vez de nos mostrarmos tristes porque tivemos muitas saudades da criança, transmitir-lhe a alegria que sentimos por estarem juntos
  • O importante é interagir naturalmente. Não é preciso estar continuamente a fazer programas fantásticos, que muitas vezes obrigam a esforços financeiros e psicológicos que “contaminam” os estados de espírito, deixando-nos ansiosos e criando na criança o sentimento de que tem que se divertir.

Usufruam do momento!

 

 

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Lidar a dois com a infertilidade

Os casais que sofrem por não conseguirem ter filhos dificilmente conseguem falar disso com outras pessoas. O problema é muitas vezes vivido apenas a dois, mas deve ser partilhado para não se tornar um sofrimento ainda maior.

Até há pouco tempo, se um casal não tinha filhos, a causa era ime­diatamente atribuída à mulher e raros eram os casos em que a pos­sibilidade de existir, também, um factor masculino era equacionada.  Actualmente, as perturbações da fertilidade são encaradas como um proble­ma de casal e não apenas da mu­lher, um problema que precisa ser vivido a dois.

Decisão. Para a maior parte dos casais, a decisão de ter filhos mar­ca o início de um período que se caracteriza por excitação, intimi­dade e alegria. Depois de a mu­lher engravidar, o casal anunciaa notícia à família e aos amigos e prepara-se emocionalmente pa­ra o nascimento. Para estes casais, conceber um filho é um processo natural que culmina na concreti­zação de um sonho! Já para os que têm perturbações de fertilidade, a decisão de formar uma família marca o início de um período difí­cil e doloroso.

Os casais inférteis submetem a sua vida ao stress causado por gráficos de temperatura, consultas, medi­cação, cirurgias e até relações se­xuais com dia e hora marcados. Se, e quando, a gravidez ocorre, o casal tem tendência para viver es­se momento com uma alegria cau­telosa. Não há a notícia para família e nem para os amigos e mais do que preocupados em preparar a chegada do bebé, ambos estão interessados num projecto a cur­to prazo que é a manutenção de uma gravidez muito frágil.

A notícia da infertilidade é vivida de modo diferente de sujeito para sujeito. Varia consoante o sexo, a personalidade, a cultura em que está inserido, a sua história pes­soal e familiar e, claro, varia de acordo com a importância de que esse filho se reveste. Estudos clí­nicos permitiram identificar pa­drões típicos de resposta à infertilidade que diferem de forma no homem, na mulher e no casal, co­mo um todo. Não subestimar es­tas diferenças constitui uma me­lhoria na vivência subjectiva e nos resultados obtidos numa interven­ção clínica.

No feminino. Para as mulheres, mais do que para os homens, o stress da infertilidade resulta nu­ma baixa da auto-estima e bem- estar geral. As mulheres têm ten­dência a apresentar o mesmo nível de perturbação, quer a causa da in­fertilidade seja sua ou do seu côn­juge. O ciclo menstrual despoleta padrões emocionais característi­cos quando a mulher tenta engra­vidar e cada ciclo é vivido com a antecipação de sucesso.

Se a gravidez não acontece, a mu­lher é invadida por desaponta­mento, depressão e desespero. Há medida que o ciclo se vai repetin­do, experimenta cada vez mais tristeza, o que a pode desgastar e impedir o comportamento dirigi­do à fertilidade.

Com os repetidos insucessos de fertilidade, as perdas sucessivas tendem a aumentar a tristeza (de­pressão) e os medos (ansiedade), que podem tomar a forma de per­da da relação, real ou imaginária, perda de saúde, autoconfiança e esperança.

Uma sensação de despersonaliza­ção ocorre com frequência com a utilização de tecnologias repro­dutivas que não recorrem ao coi­to. Algumas mulheres podem sentir-se menos femininas e pre­ocuparem-se com o desaponta­mento que julgam provocar nos outros, particularmente no ma­rido ou nos pais.

Se, após algumas tentativas, a gra­videz não acontece, a mulher tem que redefinir o seu papel de adul­ta, fazer o luto da esperança per­dida do seu filho biológico e de­cidir se adopta uma criança ou integra a sua condição de adulto sem filhos.

No masculino. No homem, ge­ralmente só após três insuces­sos de fertilidade é que ele come­ça a manifestar o mesmo nível de perturbação emocional que a sua mulher. A antiga ideia de que a in­fertilidade se devia sempre à mu­lher teve consequências na reacção comportamental do homem perante a experiência da infertili­dade e no modo como participa na investigação e tratamento.

Quando o homem é diagnostica­do com este problema, a sua per­turbação sobrepõe-se à da mu­lher, apresentando o mesmo tipo de sentimentos, em termos de es­tigmatização, percepção de perda e desafio à auto-estima. A vergo­nha é uma das respostas que apa­rece naturalmente.

A perturbação emocional pa­ra um homem infértil é maior quando carrega o diagnóstico e se sente responsável por ele. Além de viver o drama de ser infértil, o ho­mem vive ainda o drama de “pri­var” a sua companheira do filho desejado. Contrariamente, no homem fértil pode existir um senti­mento de revolta contra sua mu­lher infértil, sentindo-a como um obstáculo para o seu papel de con­tinuador do nome de família. Po­de mesmo ter fantasias de esperar estar com outra mulher de fertili­dade conhecida. Estes sentimen­tos podem desencadear sentimen­tos de culpa, ainda que raramente expressos.

Em casal. As reacções do casal face à infertilidade são as mais di­versas e nesta fase quase tudo po­de acontecer. Se a questão levanta problemas psicológicos, sociais e culturais, também o faz, necessa­riamente, ao nível da relação. A infertilidade é vivida como uma crise de vida, por vezes bas­tante complexa, e confronta o ca­sal com situações difíceis de gerir. Origina frequentemente compor­tamentos e reacções que muitas vezes são inesperados para qual­quer um dos membros do casal. Aparece o choque, a surpresa, a descrença, a frustração, a raiva, o sentimento de perda de contro­lo, o isolamento, os sentimentos de culpa, a vergonha e finalmen­te a dor.

Alguns casais lidam com a infer­tilidade aumentando o conflito e o distanciamento, o que pode ameaçar a continuidade da rela­ção e aumentar o isolamento do parceiro, que sente a dor e o de­sapontamento. Por sua vez, tam­bém a sexualidade sofre com o apertado calendário da interven­ção na infertilidade. Integrar na vida sexual a medição das tempe­raturas e as perdas das ovulações deixa pouco espaço para a espon­taneidade. Muitos casais têm difi­culdade em fazer a transição para um regime rígido de relaciona­mento sexual determinado pela ovulação. Tanto o desejo como a qualidade podem sofrer durante o ciclo. Alguns homens desenvol­vem nestas situações uma disfun­ção eréctil no meio do ciclo, difi­culdades ejaculatórias e alterações na frequência do relacionamento e desejo sexual.

A sexualidade da mulher também pode ser significativamente afec­tada pela infertilidade. Mais de metade experimenta uma quebra na frequência do relacionamento e da satisfação sexual após o diagnóstico de perturbação da fertili­dade. Por sua vez a disfunção eréc­til, vaginismo, dispareunia e falta de frequência no relacionamento sexual devido a falta de desejo po­dem contribuir directamente para a infertilidade.

Procurar ajuda. As razões por que duas pessoas se juntam ini­cialmente são os sentimentos, o amor e o desejo de partilha que sentem. Essa é a principal razão e os filhos são um complemento dessa felicidade. O pedido de aju­da a um profissional qualificado para atender o casal tem-se mos­trado importante em casos de in­fertilidade, na medida em que po­dem ser atenuados os conflitos e o stress resultante de todas estas vi­vências, criando-se condições que favorecem a fertilidade do ponto de vista psicológico.

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Depois do acto sexual

Ouvimos falar com frequência da importância dos preliminares numa relação sexual bem sucedida. Contudo, muito pouca atenção tem sido dada ao “depois”, igualmente importante numa relação sexual gratificante e emocionalmente rica.

Ao darmos pouca importância aos momentos que se seguem ao orgasmo, estamos a perder uma parte muito rica do nosso relacio­namento. Com o passar dos anos é muito frequente marido e mulher voltarem-se cada um para seu la­do após a relação sexual, adorme­cendo quase de imediato. No en­tanto, podemos ficar agradavel­mente surpreendidos com os efei­tos agradáveis que o “depois” pode ter, mesmo a longo prazo, no rela­cionamento amoroso do casal.

Três fases. O acto sexual pode ser dividido em três componen­tes: os preliminares, o acto sexu­al propriamente dito e o “depois”. Os preliminares, acerca dos quais muito já foi dito e escrito, são ge­ralmente aqueles momentos de in­timidade, jogos amorosos e sexu­ais que antecedem o coito. Podem ter uma duração muito variável, que oscila entre alguns minutos e horas, e que tem apenas como limi­te a imaginação de cada um.

O acto sexual propriamente dito, que inclui a penetração, ou coito, é o que a maior parte das pessoas considera a relação sexual e os mo­mentos de maior prazer sexual. No entanto, o que acontece após a penetração e o orgasmo pode ser tão agradável e emocionalmente grati­ficante quanto o que aconteceu an­tes. Infelizmente pouco se tem es­crito ou dito acerca desta compo­nente da relação sexual.

Um estudo desenvolvido nos Esta­dos Unidos mostra que uma gran­de percentagem dos casais ques­tionados adormecem no espaço de uma hora após a relação sexu­al. Surpreendentemente, quer o homem como a mulher expres­sam os mesmos desejos e expecta­tivas em relação àquilo que gosta­riam que se passasse. Por outro la­do, a maior parte dos entrevistados não se sente satisfeito com a sua vi­vência actual do “depois”.

Tabu? De um modo geral, a refe­rência ao que corre bem na relação sexual exclui a fase pós-coital, o “depois”. Será este um assunto ta­bu? E se os resultados apresenta­dos no referido estudo puderem ser extrapolados para a popula­ção em geral, porque será que o “depois” parece ser um momento tão pouco valorizado pelos aman­tes ou, pelo menos, não satisfató­rio? Essencialmente, duas explicações parecem ser plausíveis: fa­diga e ignorância.

A fadiga ocorre como consequên­cia do orgasmo, processo regulado pelo sistema nervoso parassimpático, o que significa que induz uma sensação intensa de relaxamento. Assim, é natural que o sono apare­ça rapidamente, particularmente no homem. Já a ignorância prende- se com a natureza fisiológica do ho­mem e da mulher.

O ginecologista William Masters e a psicóloga Virginia Johnson, pio­neiros em investigação de compor­tamento sexual e autores de várias obras sobre o tema, apresentam ex­plicações que esclarecem estas di­ferenças de género. Dizem os es­pecialistas que o homem retoma os batimentos cardíacos e a res­piração mais rapidamente do que a mulher. Assim, enquanto o ho­mem tem um período de resolu­ção consideravelmente rápido, o da mulher é bastante mais lon­go, mantendo os sinais de excita­ção durante mais tempo na fase pós-coital.

Não ditos. Se o acto sexual for rápido, intenso e insatisfatório, os parceiros, em especial a mulher, podem experimentar um estado depressivo pós-coital. A sensação de vazio e ressentimento pode ser atenuada por um “depois” emo­cionalmente rico e envolvente. Já se durante a relação sexual ocor­rer algo de inesperado ou negati­vo, nomeadamente num casal que tenha o hábito de valorizar o “de­pois”, a sensação de vergonha ou mal-estar pode ser atenuada nes­tes momentos.

O mesmo já deve ser encarado com alguma prudência se a vi­vência do “depois” não for habi­tual, para que não possa ser con­fundido com atitudes desencade­adas por sentimentos de piedade. Nestas situações, virar para o lado e dormir ou discutir abertamente o ocorrido pode ser penoso, mas certamente menos gerador de equívo­cos que, por decorrerem do não di­tos, podem ser mais difíceis de es­clarecer.

Não fazer. Algumas situações que deveriam estar definitivamente fora destes momentos incluem, entre outras:

  • Demonstrar ao parceiro que um momento muito gratificante acabou de acontecer e o que resta é desinteressante.
  • Aproveitar a boa disposição do parceiro para falar da relação ou dar conta de situações menos agradáveis no seu comportamento do dia-a-dia.
  • Aproveitar o clima de intimidade para discutir problemas de emprego, de finanças caseiras ou relacionadas com os filhos.
  • Não respeitar a possível vulnerabilidade do outro para criticar a sua performance ou compará-la com a de anteriores parceiros.
  • Não sair da cama imediatamente após a relação sexual, coisa que impede totalmente a oportunidade de vivenciar o “depois”.
  • Não implementar novas formas de estar na relação repentina­mente, só porque lemos numa revista que seria a forma “correcta” de valorizar uma relação sexual.

Ser divertido. Alterar hábitos depende acima de tudo da sensi­bilidade do casal. Muitas pesso­as optam apenas por permanecer com os seus corpos juntos, sabore­ando o toque, o cheiro, o sabor de cada um quase como o prolongar de uma satisfação, bastante mais emocional nesta fase. Outros pre­ferem trocar carícias.

Qualquer que seja a opção do casal, ela deve ser divertida e agradável para ambos. É bom receber carí­cias, mas, lá por gostarmos tanto, não devemos sentirmo-nos mago­ados se o outro as rejeitar e preferir apenas permanecer junto.

Uma conversa centrada na intimi­dade do casal, daquilo que um va­loriza no outro, pode potenciar os aspectos emocionais positivos da sexualidade e fortalecer os laços da relação — o que também acon­tece quando partilhamos uma his­tória divertida, um sorriso de cum­plicidade.

Outro factor muito importante pa­ra vivenciar bem o “depois” pren­de-se com a hora do dia geralmen­te escolhida para o relacionamen­to sexual. Os casais que escolhem a noite irão ceder mais facilmente à fadiga e adormecer. Optar por ou­tras horas do dia para o relaciona­mento sexual é, por isso, uma forma de fugir ao silêncio e enrique­cer uma parte muito importante do nosso relacionamento.

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Amigos para todas as ocasiões

Os amigos têm características muito próprias e variadas que quase sempre nos ajudam a enfrentar crises pessoais mediante diferentes soluções.

Os amigos que estão sempre em festa podem ser uma importan­te ajuda quando a solução para o nosso problema é simplesmen­te sair para dançar e ver pessoas. Nessas alturas não há como a boa disposição daqueles amigos que estão sempre prontos para nos ar­rastar para o último bar da mo­da. São, na verdade, o par perfei­to quando sentimos que a depres­são e a tristeza nos inibem a capa­cidade de encarar os problemas e tiram força para fazer aquilo que desejamos e que sozinhos não con­seguimos.

Há, no entanto, que não confundir os números de telefone, pois na ge­neralidade estas pessoas encaram a vida de forma superficial, não promovendo com essa forma de estar a reflexão sobre os assuntos. Muitas vezes este estado de festa constante resulta de uma fuga à realidade e de uma incapacidade de lidar com o sofrimento, e ain­da que possa ser bastante positivo puxar um amigo para fora de casa, também devemos reflectir e, quem sabe, sofrer um pouco.

Amigo honesto. É aquele que nos diz tudo, o que queremos e não queremos ouvir. Pergunta o que mais ninguém tem coragem de perguntar, mesmo que as res­postas sejam duras de encarar. Existem momentos, no entanto, em que a franqueza pode ser mui­to indigesta. Ainda que sábias, as palavras de um amigo podem não ser exactamente aquilo que preci­samos para modificar uma situa­ção. A mais-valia deste tipo de ami­gos consiste na sua franqueza, que em muitos casos é o empurrão ne­cessário para pôr em prática o que sabemos que precisa ser feito.

Os velhos amigos, com quem por vezes estamos apenas uma vez por ano, têm também um papel muito importante nas nossas crises. Pro­vavelmente não estão connosco no momento em que ela se decla­ra ou em que precisa de ser resol­vida, mas a distância dá uma visão mais objectiva e descomprometi­da que nos leva a encarar soluções que muitas vezes já conhecíamos e apenas precisávamos de aplicar a novos contextos.

Reencontrar um velho amigo também é uma possibilidade de ter uma conversa agradável e descomprometida em que são recor­dados velhos acontecimentos e so­luções que se revelam muito úteis para o momento actual. Na medi­da em que a solução dos nossos problemas tem de vir de dentro, recordar com um velho amigo de infância características que sempre tivemos e que deixámos ador­mecer pode ter um papel prepon­derante para encontrarmos solu­ções para as crises.

Ombro amigo. Outro tipo de amigos são aqueles que sabemos poder confidenciar as maiores angústias e problemas, que estão sempre pronto para ouvir e que assumem uma importância fun­damental em momentos de crise aguda. Geralmente, nestes mo­mentos de crise mais intensa pro­curamos esta faceta da amizade e é bom termos alguém que sabe ouvir. Nem sempre nos oferecem soluções, mas inspiram confian­ça e são capazes de nos dar colo. São muitas vezes considerados os verdadeiros amigos e o que os tor­na tão especiais é a sua capacida­de de ouvir, a sua sensibilidade e bom senso. Mas a melhor qualidade talvez seja a capacidade de ou­vir. E saber ouvir é cultivar a difí­cil arte da empatia, que, descrita de uma forma muito simples, é a capacidade de nos colocarmos no lugar do outro.

Saber ouvir. Comunicar é mui­to mais que a simples troca de pa­lavras. Há um número infinito de nuances que geram estímulos percebidos e recebidos pelo outro, através dos quais a comunicação se processa. O olhar, o tom de voz um pouco diferente, um franzir de so­brolho, um sorriso podem comu­nicar muito mais do que apenas as palavras nos dizem. Saber ouvir é muito mais do que escutar. Saber ouvir é sermos capazes de nos co­locar no lugar do outro, prestar atenção ao significado das pala­vras, à forma como a mensagem está a ser transmitida, ao estado emocional que se processa cm nós e no outro.

Os bons amigos são capazes de ou­vir. Com frequência estamos de tal forma orientados para encontrar soluções que muitas vezes nos es­quecemos de ouvir o que o nosso amigo precisa de desabafar. Mui­tas vezes o seu pedido é só esse e, como tal, dar-lhe mais é sinal de que não o percebemos.

Ouvir aquele que sofre exige da nossa parte uma capacidade de abdicação e entrega muito gran­de. Implica sermos capazes de dispor do nosso tempo para par­tilhar o seu sofrimento. Mas se é bom ter este tipo de amigos, nem sempre é fácil sê-lo. Por vezes o excesso de desabafos pode tor­nar-se prejudicial para a amiza­de. Também podemos sentir leal­dades conflituais, quando as ques­tões que nos são colocadas envol­vem pessoas com quem temos re­lações igualmente fortes. Por ve­zes, a melhor forma de ajudar um amigo é encaminhá-lo para um especialista, eventualmente um psicólogo, que está treinado para lidar com questões da distância, pois não tem uma relação de ami­zade a preservar.

Tinha um amigo que, sabendo da minha formação, desabafava com frequência as suas desaven­ças conjugais. A minha relação de amizade era mais forte e an­tiga com ele, mas também com a sua mulher. Por sua vez, o tipo de problemática que me trazia repe­tia-se com muita frequência. Mu­davam os conteúdos mas a forma mantinha-se. Tentei ajudá-lo ouvindo-o e incentivando-o a ques­tionar-se sobre outras formas de olhar para o assunto. Mas a rela­ção de amizade complicou-se. A minha incapacidade para lhe for­necer soluções com que concor­dasse, a minha recusa em servir de “pombo-correio” entre ele e a mulher, começou a arrefecer a re­lação. Finalmente entendi que a melhor ajuda que podia prestar a este casal, que também era meu amigo, era indicar-lhes um profis­sional que fosse capaz de guardar a distância necessária para conse­guir a objectividade, também ne­cessária, que obviamente eu já tinha perdido. Com isso salvei uma boa amizade com duas pessoas, que hoje já não estão juntas.

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Infidelidade: Restaurar a confiança

Uma traição induz muito sofrimento no casal e põe em causa uma das certezas mais importantes da sua base: a confiança.

Grande parte da hesitação que as pessoas sentem em confiar de no­vo após terem sido enganadas é sentirem que foram ingénuas e não quererem repetir o mesmo er­ro. É uma preocupação justificada, na medida em que a confiança que ambos os elementos do casal depo­sitam um no outro se baseia no mi­to da monogamia.

Prevenir. Não existem técnicas para prevenir situações de infidelidade. Contudo, há ideias-chave que os casais devem partilhar e que podem ajudar a evitar o desenvolvimento de relações extra-conjugais:

  • Estar ciente que ninguém é imune a uma relação fora do casamento.
  • Assumir um compromisso de honestidade, que, no fundo, é mais forte do que apenas uma promessa de monogamia.
  • Procurar continuamente uma comunicação aberta e honesta sobre tudo o que afecta o relacionamento, incluindo a atracção por outras pessoa.

Restaurar a confiança. Os mi­tos têm, de facto, a capacidade de nos fazer acreditar que não preci­samos de lutar por aquilo que que­remos, na medida em que nos as­seguram essa realidade. Recons­truir a confiança é, por isso, o ob­jectivo mais difícil e necessário de atingir neste processo de reconci­liação, não só com o outro mas também connosco. A urgência de levar o outro a acreditar que é pos­sível confiar de novo leva, com fre­quência, a cometer o erro de afir­mar a nova forma de estar através daquilo que acabámos de negar, atestando a nossa crença na mo­nogamia.

A verdade é que restaurar a con­fiança não passa apenas por rea­firmar algo que provámos não ser possível, mas envolvermo-nos se­riamente num compromisso ho­nesto, o que, entre outros, envolve partilha de sentimentos. Quando isso acontece, e quando existe ca­pacidade para partilhar com o par­ceiro os medos, interesses e, até, atracções por terceiros, estamos a construir uma relação baseada na confiança e com um entendi­mento mútuo bastante mais pro­fundo. O maior entrave com que nos deparamos nesta situação é assumir que a relação extraconju­gal terminou. Outro é saber se so­mos capazes de ultrapassar a má­goa e se o que sentimos pelo outro ainda é suficientemente forte pa­ra que faça sentido recomeçar. Co­mo sempre, recuperar a confiança é essencial.

Procurar ajuda. Este objectivo é atingido mais facilmente quando homem e mulher procuram uma terapia de casal a que ambos ade­rem —o que não acontece numa te­rapia individual, que, numa fase inicial, pode contribuir para uma alienação ainda maior entre o casal, mas não significa que após a terapia de casal cada um fique im­pedido de procurar ajuda indivi­dual para compreender os pro­blemas emocionais que conduzi­ram à infidelidade. Trabalhar em conjunto com um terapeuta aju­da a contextualizar a infidelida­de, a explorar os problemas con­jugais e, eventualmente, a evitar o divórcio ou optar por uma forma construtiva de o realizar.

Geralmente quem comete a infi­delidade é muitas vezes atacado pelo seu comportamento e é difí­cil ao casal conseguir adoptar um comportamento que promova o diálogo. Ora, o terapeuta permi­te criar um contexto seguro, con­fidencial e equilibrado, no qual o trabalho conjunto com o casal re­side na reconstrução do seu rela­cionamento.

Pontos comuns. Este trabalho terapêutico, ainda que seja dirigi­do ao casal, tem em consideração reacções individuais que são co­muns em praticamente todas as situações de infidelidade. Assim, é comum encontrar em ambos os cônjuges uma reacção depressi­va ao acontecimento, ansiedade e um profundo sentimento de per­da. Normalmente, o cônjuge traí­do apresenta reacções que incluem uma necessidade quase obsessiva de recordar os detalhes do rela­cionamento extraconjugal e um escrutínio constante na procu­ra de sinais de novas traições. Es­tas manifestações são semelhan­tes às que encontramos no stress pós traumático e devem ser enca­radas como tal do ponto de vis­ta terapêutico. Por outro lado, o cônjuge envolvido na relação ex­traconjugal pode recear um casti­go “eterno” pelo seu acto, ao mes­mo tempo que tem que fazer o lu­to dos sonhos e vivências dessa re­lação. Trata-se de um processo im­portante a ter em conta durante a terapia, na medida em que pode comprometer o envolvimento na intenção anunciada de recupera­ção do actual casamento.

Durante a primeira fase da te­rapia torna-se necessário clari­ficar o objectivo que move o ca­sal: reconstruir o casamento, re­solver a ambivalência no sentido de continuar ou não o casamen­to ou optar por um divórcio cons­trutivo. Não é necessário que am­bos estejam inicialmente de acor­do quanto a esse objectivo e pode muito bem acontecer que durante a terapia este evolua num ou nou­tro sentido.

Processo terapêutico. De acor­do com William Doherty, membro da Associação Americana de Tera­pia Familiar, existem três fases a considerar durante o processo te­rapêutico com durações e conteú­dos distintos.

A primeira, que tem lugar duran­te o primeiro mês após a decisão do pedido de ajuda, o casal pode sentir o renascer da esperança e da sensação de prazer na sua relação. A crise imediata é contida e a deci­são conjunta de procurar ajuda dá a ambos a noção de trabalho con­junto e investimento mútuo.

Numa segunda fase, que pode du­rar alguns meses, o terapeuta tra­balha com o casal a relação extra­conjugal e os problemas anteriores do casamento. Trata-se de uma fa­se muito delicada, na medida em que poderá haver tendência para colocar a responsabilidade no ou­tro ou nos problemas conjugais.  Com estas questões aparecem fre­quentemente reacções de zanga, raiva e angústia do elemento traí­do, o que contrasta com o clima da primeira fase. A reconstrução da confiança remete com frequência para reacções incongruentes, pa­ra avanços e recuos, que o parcei­ro que teve a relação extraconju­gal tem de aprender a tolerar, no­meadamente com a ajuda do tera­peuta, que procurará colocar estas reacções em contexto, permitindo ao casal compreendê-las à luz de outra realidade que não a falta de vontade em cooperar.

Numa terceira fase, provavelmen­te a mais longa, a terapia é orienta­da no sentido de reconstruir o rela­cionamento. A ideia-chave é sem­pre a mesma: não adianta fazer mais do mesmo, há que ser cria­tivo, inventivo na forma de estar e saber cativar. O desenlace nem sempre é feliz. Muitos casais uti­lizam um relacionamento extra­conjugal como pretexto para pôr fim ao casamento actual, muitos deles porque não sabem trabalhar o que o afasta do outro e da rela­ção. No entanto, casais que se en­volvem e comprometem num pro­cesso muitas vezes difícil e peno­so conseguem um casamento mar­cado por um maior entendimen­to, proximidade e, especialmen­te, cumplicidade.

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Aborto Espontâneo , Sonho adiado

Com o aparecimento da pílula e de técnicas de reprodução medicamente assistida, aquilo que para muitas mulheres passaria despercebido passou a ser vivido como um problema real: a interrupção involuntária no início da gravidez, ou seja, qualquer momento antes das 20 semanas de gestação.

Os abortos espontâneos são mui­to comuns. As estatísticas mos­tram que para as mulheres que tomam como medida de gravidez a falta de menstruação, cerca de 15% tiveram um atraso menstru­al sem uma gravidez subsequen­te. No entanto, o aparecimento de testes altamente sensíveis permi­te detectar uma gravidez ao fim de cinco ou sete dias após a fertiliza­ção do óvulo, cerca de uma sema­na antes do período menstrual. Se ao primeiro grupo juntarmos es­tas gravidezes detectadas tão pre­cocemente, o número de abortos espontâneos sobe para 3o%.

Explicação médica. As causas deste tipo de aborto podem ser muito diversificadas e parecem não reunir consenso. Contudo, alguns estudos apontam para que cerca de metade destas situações se devam a um erro genético no momento da concepção. Trata-se da resposta da mãe natureza a es­ta situação, descartando o ovo que resultaria num embrião inviável ou numa criança com problemas graves.

Contrariamente ao que muitos ca­sais julgam, o aborto não se deve, na maior parte dos casos, a atitu­des erradas, ainda que a adopção de um estilo de vida saudável, no que diz respeito ao exercício, ali­mentação e hábitos tabágicos e al­coólicos, potcncie a fertilidade do casal. Muitos médicos consideram o primeiro aborto deste tipo como fruto do acaso, embora esta expli­cação seja insuficiente para os fu­turos pais. A avaliação médica des­tas situações apenas se inicia após o terceiro aborto e, mais uma vez, a hipótese de haver uma falha ge­nética é muito grande.

Para identificar a causa dos abor­tos espontâneos, a mulher deve su­jeitar-se a uma série de testes. Um dos primeiros factores que deve ser pesquisado é a existência de ano­malias estruturais do útero, ana­tómicas ou não, que comprome­tam a implantação do embrião.

Esta parece ser a causa em 12% dos casos, apesar de muitos pro­blemas anatómicos poderem ser corrigidos cirurgicamente.

Os níveis hormonais são outra área de investigação. Por vezes o corpo da mulher não produz a quantida­de de progesterona necessária pa­ra permitir o crescimento do endo­métrio após a concepção. Noutros casos, um desequilíbrio da tiróide ou o aparecimento de uma diabe­tes também podem dar origem a este tipo de aborto. Nestes casos, a compensação hormonal e do es­tado metabólico em geral pode ser suficiente para que uma nova ten­tativa seja bem sucedida.

O estudo da mulher e do parcei­ro quanto a doenças sexualmen­te transmissíveis e outras, como a rubéola, é também necessário. Da mesma forma, o casal deve efectuar uma análise cromossó­mica através da determinação do cariótipo de cada um. Em alguns casos, raros, um dos cônjuges po­de ser portador de uma estrutura genética anormal que poderá in­viabilizar uma gravidez.

Lidar com a perda. Perder uma gravidez deixa qualquer casal nu­ma luta intensa para recuperar o equilíbrio emocional, ao mesmo tempo que o corpo da mulher re­cupera das alterações físicas. Se al­guns casais parecem pouco afecta­dos pelos acontecimentos, outros experimentam sentimentos de perda que os podem levar a uma instabilidade emocional e, por ve­zes, uma depressão reactiva a tu­do o que se passou. Muitos os ca­sais expressam uma tristeza que até aí não julgavam ser possível sentir e esse sentimento tem ten­dência a agravar-se com o número de abortos.

O modo como a mulher e o seu par encaram o aborto espontâneo é ge­ralmente diferente: a mulher ne­cessita de rever e falar acerca da perda, enquanto o homem se mos­tra mais prático e orientado para ultrapassar a situação. Isto não significa que o homem não este­ja a sofrer — as pessoas nem sem­pre ultrapassam os mesmos problemas ao mesmo ritmo ou com as mesmas soluções. De uma for­ma geral é o homem que consola a mulher, mas este não deve ser o único a proporcionar conforto. Cada um necessita de contar com o outro para dar suporte e confor­to, encontrando um espaço em que ambos se permitam estar infe­lizes, estar tristes, poderem falar e confraternizarem com outras pessoas sem julgamentos de valor quanto à forma como cada um rea­ge em determinado momento. Se já existem outros filhos, é nor­mal que eles expressem o senti­mento de responsabilidade pelo sucedido. Assim, devemos ouvir as suas preocupações e tentar ex­plicar-lhes o que se passou. As crianças devem ter a possibilida­de de partilhar e compreender a tristeza dos adultos e de expres­sar a sua própria tristeza.

Processo emocional. Todas as perdas representam objectivos que não foram atingidos, sonhos que se desvanecem e trazem algum pessimismo na forma de encarar o futuro. Em qualquer perda exis­te subjacente um processo que pode ser identificado através das se­guintes etapas: choque e negação; raiva, culpa e depressão; aceitação. Cada uma destas fases é necessá­ria para ultrapassar a perda. Leva tempo a ser superada e a forma que assume pode variar muito de pes­soa para pessoa.

A patologia apenas acontece quan­do há fixação apenas numa destas etapas e recusa em passar à scguin­te, no sentido da aceitação. Podem existir factores que favorecem es­sa fixação. Alguns podem ser ante­cipados e evitados, outros não. Se, por exemplo, se sofreu uma perda recente, e o momento do processo é o da raiva, culpa e depressão, e te­mos um convite para uma festa de crianças em que o ambiente não é adequado à nossa forma de estar, será melhor não comparecer à fes­ta e sair, envolvendo-se noutras ac­tividades que dêem prazer ao ca­sal. No entanto, se não for possível evitar situações como esta, então será melhor encará-las como incó­modos temporários inevitáveis. Percorrer o processo de luto faz parte da recuperação. Não faz de­saparecer a perda nem permite es­quecer, mas com o tempo permite encontrar um lugar para arrumar confortavelmente esta perda. Importa saber que todas as reac­ções são normais e o casal não de­ve sentir medo ou retracção em expressar e eventualmente expor a um terapeuta os seus medos e preocupações

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Ser Pai

A gravidez é um período geralmente desejado e bem recebido pelos casais. Mas se para a mulher significa um tempo de transformação e novidade, para o homem é muitas vezes um período marcado por um misto de alegria e ansiedade.

Quanto à alegria, a sua razão pa­rece-me evidente. Já a ansiedade está muitas vezes relacionada com a incapacidade em compreender e ajudar a mulher a ultrapassar as dificuldades decorrentes das transformações da gravidez.

Primeiro trimestre. Qualquer tipo de ajustamento gera stress e a preparação para um novo ser na família é uma enorme mudan­ça no estilo de vida de cada um de nós. O espaço físico e mental vai ser alterado e partilhado por um bebé. Os próximos nove me­ses são momentos de incerteza e novidade para a mulher e para o homem.

Compreender as alterações que vão ocorrendo durante este período pode ajudar o casal a ultrapas­sar pequenos desentendimentos. Assim, durante o primeiro tri­mestre a mulher experimenta grandes mudanças no seu am­biente hormonal de maneira a preparar o corpo para gerar uma nova vida. Nesta fase é comum as mulheres mostrarem-se susceptí­veis, com mudanças súbitas de hu­mor, especialmente no sentido da irritabilidade e do humor depres­sivo. Os enjoos matinais não são comuns a todas as mulheres, mas aquelas que os sofrem referem que os mesmos desaparecem ao fim dos primeiros dois a três me­ses. Cheiros, habitualmente tole­rados, como comida, tabaco, etc., podem tornar-se incómodos e des­poletar situações de enjoo.

Para ajudar a ultrapassar estes incómodos, o marido pode ter em atenção os intervalos entre re­feições, até porque um estômago vazio pode aumentar a sensação de náusea e uma ida ao cinema pode ser mais descansada e agra­dável para ambos se antes cuida­rem do estômago antes de entra­rem na sala.

Segundo trimestre. Durante o segundo trimestre o maior desa­fio surge com as alterações que o corpo da mulher começa a sofrer. A mulher pode ganhar peso de uma forma repentina e a presen­ça do bebé torna-se mais eviden­te através de movimentos que são percebidos pela mãe e muitas ve­zes visíveis para o pai. Durante este trimestre torna-se possível ou­vir o som do batimento cardíaco do bebé e vê-lo nas ecografias. Do ponto de vista psicológico, es­te é um período em que o bebé faz a sua aparição de forma mais evi­dente. Se até aí constituía uma ideia, um sonho bonito, agora a sua presença começa a condicio­nar ainda mais a vida do casal. Al­guns dos futuros pais começam a notar que por volta do segundo trimestre a mulher começa a de­monstrar alterações no apetite se­xual. A resposta das mulheres às mudanças que estão a ocorrer é di­ferente. Algumas tornam-se sexu­almente mais receptivas e alteram a sua frequência nas relações sexu­ais. Outras podem simplesmente estar demasiado cansadas ou preocupadas se o acto sexual irá pre­judicar o bebé. As experiências relatadas deste segundo trimes­tre são muito diferentes de casal para casal mas a verdade é que não existem regras para encarar a vida sexual. Os casais devem ape­nas informar-se dos reais incon­venientes que podem estar rela­cionados com a sua gravidez em particular.

Falar abertamente acerca das mu­danças que foram percebidas po­de ser uma forma de evitar dis­cussões e mal-entendidos entre alguém preocupado em criar o melhor ambiente para a nova vida e um futuro pai que começa a per­ceber que vai ter que partilhar a sua mulher com o bebé. Este é um momento único para o casal come­çar a experimentar novas formas de relacionamento, especialmen­te marcadas pelo compromisso en­tre o que quer, o que era habitual e as novas necessidades.

Terceiro trimestre. O tercei­ro trimestre é o período marcado pela preparação para o parto. As últimas semanas de gravidez pa­recem eternas para o futuro pai e para a mãe e os dois começam a verbalizar de forma mais intensa a sua preocupação com o bem-es­tar do bebé e se este será perfeito.

A aproximação do parto aumenta os receios dos futuros pais relati­vamente ao que irão encontrar. Outro problema que muitas vezes começa a ser verbalizado pelos fu­turos pais, com o nascimento emi­nente do filho, prende-se com as responsabilidades financeiras. Es­te pode ser um momento impor­tante para o casal rever a sua forma de estar na vida e chegar a consen­sos relativamente ao que conside­ra fundamental para a boa relação do casal e para a educação e bem—estar do seu filho. Para alguns ca­sais, habituados a viverem para os dois, sem preocupações com o fu­turo, pode ser um assunto difícil. A preparação de um orçamento antecipado pode ter vantagens. Quando se aproxima o momen­to do parto é comum as mulheres expressarem o seu medo da dor ou do parto. Dizer-lhe apenas que “tudo irá correr bem”, geral­mente não é muito eficaz. Impor­ta perceber a dois, antes da “hora H” qual o papel do pai, como pode ser um elemento securizante e co­mo pode participar neste momen­to, que, quer se queira ou não, vai ser vivido de forma muito inten­sa pela mulher. Principalmente, é necessário que ambos estejam conscientes das suas responsa­bilidades e limitações: a mulher não pode esperar que o marido não tenha dificuldades ou hesita­ções relativamente à sua conduta, ou mesmo que tenha dificuldade em presenciar o seu sofrimento. Não significa desinteresse, me­nor importância ou desprezo pe­lo momento, mas todos temos as nossas limitações.

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Terapia de Casal

Ao longo da sua história, todos os casais passam por dificuldades no seu relacionamento e as causas nem sempre se relacionam com fenómenos “estranhos”. Podem resultar de crises naturais do desenvolvimento da relação, de circunstâncias externas como o desemprego, doença de um familiar ou mesmo de fatores de personalidade de ambos os cônjuges. As pessoas procuram a terapia de casal por muitas razões e cada casal é diferente, mas as queixas mais frequentes são falta de comunicação, discussões constantes, necessidades emocionais que não são atendidas, problemas financeiros e conflitos com as famílias de origem. Estes são problemas presentes em quase todas as relações e o pedido de ajuda surge como o resultado do aumento da frustração e desapontamento que progressivamente se vai instalando. Outras causas prendem-se com situações de infidelidade, sensação de perda de afeto, carinho ou um acontecimento traumático, como, por exemplo, a morte de um filho.

Influências. Não é novidade dizer que o casamento, a relação a dois, constitui uma realidade complexa e desafiadora, compensadora e dolorosa. A natureza das relações acaba por ser fruto da forma como o casal lida com os diversos fatores que a influenciam. Por exemplo, os casais não tradicionais (sem filhos ou com elementos do mesmo sexo) têm que se disponibilizar para ultrapassar obstáculos adicionais para que a relação funcione.

A sociedade influencia a forma como os relacionamentos se vão estruturando e estes acabam por sofrer o impacto das mudanças ao nível social. Por exemplo, no contexto atual e na sociedade ocidental os casais constituem-se e vivem os seus relacionamentos esperando uma intimidade emocional e sexual intensa, igualdade de sexos e tolerância em relação à diferença. Se recuarmos algumas dezenas de anos, tal seria não só impossível como estranho. Contudo, constatamos alguma contradição entre esta liberdade de escolha e o número de divórcios e muitas vezes perguntamo-nos porquê?

Na realidade, as mudanças que têm acontecido na sociedade, mesmo as positivas, ocorreram a um ritmo que se tornou perturbador, na medida em que as pessoas levam tempo a integrá-las no seu modo de pensar e agir, gerando-se assim um conflito entre a tradição c a necessidade de integração face às regras da sociedade. Se em teoria gostamos de poder ser livres e escolher o nosso companheiro em função da existência ou não de um laço amoroso, a verdade é que temos dificuldade em transformar em atos o respeito pelo autodeterminismo sem nos sentirmos menos família, pois, afinal, o modelo que ainda está fortemente enraizado nas nossas mentes diz-nos que um casal tem prazer em partilhar tudo.

Por sua vez, as importantes alterações económicas que aconteceram na sociedade e que levam ao desemprego, à dificuldade de arranjar o primeiro emprego ou às reformas antecipadas exigem que o casal se adapte àquilo que são desvios à evolução normal do seu ciclo de vida. Encontrar empregos adequados e casas compatíveis é difícil para os jovens, que permanecem em casa dos pais quando deveriam procurar desenvolver os seus relacionamentos. Os seus pais podem ambicionar a sua liberdade ou estar a atravessar mudanças importantes na sua vida e têm que partilhar esses momentos num regime alargado, quando era suposto voltarem a ser apenas dois. Também os media promovem o consumismo e a ideia de que o casamento e a vida em família é relativamente feliz e livre de conflitos, criando uma enorme pressão devido a expectativas que se revelam inatingíveis. Como resultado, o stress emocional e económico acaba por cobrar a sua parte na relação.

Adicionalmente, cada um dos elementos do casal pode estar a atravessar vivências individuais complexas no seu crescimento psicológico e emocional, o que nem sempre encaixa à primeira na vida do casal.

O que é? Antes de mais, importa dizer que não existe um modelo ideal e universal para uma relação. A “boa relação” é aquela que funciona para os dois elementos do casal e lhes permite alcançar os seus objetivos, individuais e de conjunto. Se isso não funciona, não significa necessariamente que o casal necessite de terapia.

Todas as relações passam por momentos difíceis e as fases de crise são também momentos privilegiados para o crescimento e introdução de novas regras de funcionamento. No entanto, um ou os dois elementos do casal podem sentir- se continuamente insatisfeitos, frustrados, incompreendidos e se não foi possível resolver os assuntos de forma aceitável para ambos, então é altura de pedir ajuda profissional.

A terapia de casal é um meio de resolver problemas e conflitos que os casais não conseguem trabalhar de forma eficaz entre si. Envolve os dois elementos na presença de um psicoterapeuta com treino específico para conversar com eles os seus pensamentos, sentimentos e emoções acerca da relação. O objetivo é permitir que cada um consiga um melhor entendimento de si e do seu parceiro, para decidirem se precisam ou querem fazer mudanças e, se assim for, ajudá-los a estabelecer e atingir objetivos.

Esta forma de terapia envolve apenas o casal. Podem discutir-se situações relacionadas com os filhos, mas sem a presença deles. Pretende-se que o casal possa desfrutar de um espaço e de um tempo para cuidar de si, longe das interferências dos filhos ou das famílias de origem. A terapia que envolve pais e filhos desenrola-se de forma diferente e geralmente é conhecida por terapia familiar.

Mediador. O papel do terapeuta é ouvir os intervenientes e ajudá-los a identificar e clarificar áreas problema. Começa por perceber como cada um vê o problema, qual a história do relacionamento e os aspectos relevantes da história com as famílias de origem. Após a discussão e avaliação da situação, é proposto um plano terapêutico. O terapeuta actua quase como um mediador, tentando, por exemplo, clarificar mal-entendidos na comunicação, promovendo novas formas de olhar para situações aparentemente sem saída.

Novas perspetivas resultam numa mudança de sentimentos e comportamentos, o que permite lidar com as dificuldades e criar disponibilidade para novas formas de estar.