A capacidade de nos relacionarmos os outros está, em primeiro lugar, ligada à capacidade de nos auto-relacionarmos. Daí que o auto-conhecimento seja cada vez mais procurado, seja através de terapia ou de técnicas de meditação oriental.
Cada um de nós procura o seu interior motivado, na minha opinião, pela procura de segurança pessoal. Quero saber quem sou para ter mais segurança em mim. Quero saber quem sou, para saber quem procuro ou o que procuro no outro. E há medida que vou crescendo esta questão é cada vez mais importante. Quem sou eu? O que necessito? O que me atrai, o que me cativa, o que me satisfaz? Fala-se de um mundo novo, de um mundo despojado de certezas, de afirmações absolutas, de caminhos correctos, de lugares seguros. Há um risco maior, há solicitações permanentes, há obrigações inadiáveis, há trabalho constante e muito pouco tempo para nos dedicarmos a nós próprios e ao outro. Daí que quando escolhemos os amigos ou o companheiro com quem queremos partilhar a nossa vida sejamos mais exigentes e selectivos nessa escolha, que tende a ser cada vez mais verdadeira e independente de questões sociais ou culturais.
Crescer com os desafios. Perante novos desafios podemos tomar duas opções: recusar o desafio e procurar refúgio no que é seguro, familiar e protetor ou aceitar o risco e experimentar novos papéis, situações e sensações.
Crescer implica enfrentar medos, ter a coragem de desafiar pressupostos antigos, questionar verdades absolutas, ponderar caminhos tidos como certos, aceitar correr riscos. Muitas vezes preferimos viver agarrados a tradições, costumes, regras, verdades que nos fazem sentir seguros (e provavelmente infelizes), do que aceitar novas maneiras de ser e fazer, de sentir, de pensar, de estar.
Crescer implica realizar mudanças pessoais, alternando entre avanços e retrocessos, movimento e estagnação, busca de novas sensações ou refúgio nas antigas. Pode significar dor, desvinculação, separação, mas também segurança, força, alegria e determinação. Uma mudança pessoal vai para além da mudança observável. A mudança física, objetiva e concreta é mais simples de realizar do que a mudança interior. Com maior ou menor dificuldade, mudamos de casa, de emprego, de cidade, alteramos hábitos de vida ou adaptamo-nos a novas circunstâncias. No entanto, a mudança interior necessária para nos adaptarmos a novos desafios da vida é muito mais dura e difícil de conseguir.
A mudança interior permite maior capacidade de adaptação à vida e de realização pessoal. Realizar uma mudança implica enfrentar medos, desafiar a autoridade, estar preparado para assumir a responsabilidade pelos próprios atos.
Perante acontecimentos que desafiam a nossa maneira de pensar e de agir, ou perante situações que nos obrigam a tomar opções, podemos optar por dois caminhos: a estagnação ou a evolução.
Crescer ou estagnar? Se as pressões ou os desejos para a estagnação prevalecem, tendemos a negar as oportunidades de vida que nos surgem, recusando-as ou encontrando justificações que nos permitem pô-las de parte sem nos sentirmos culpados. Impedimo-nos de arriscar numa relação porque temos medo de ser magoados, ou prolongamo-la indefinidamente no tempo por medo de ficarmos sós; não aceitamos um novo emprego aliciante porque o atual é seguro e fixo, ou recusamos uma nova tarefa porque temos medo de não sermos bem sucedidos a fazê-la; não partimos em viagem com medo de não conseguirmos voltar ou andamos sempre de lado para lado porque temos medo de parar.
Neste caminho não conseguimos aceitar que temos medo, que podemos errar e que, por isso, optamos por viver estagnados mas “seguros” a um modo de vida. Normalmente agarramo-nos aos pressupostos que nos foram incutidos na infância, seguimos as pisadas daqueles em que confiamos, deixamos os mais próximos decidir o nosso rumo. Definimo-nos mais por aquilo que partilhamos com o outro do que pelas características que nos são próprias ou exclusivas. Há uma tendência para a fusão com o outro.
Mais desafios. “Eu sou a relação que formo com o outro; perder a relação significa perder-me a mim mesmo”. Esta situação pode ser muito angustiante e obrigar a um grande desgaste pessoal, pois na corrida para satisfazermos os desejos do outro deixamos para trás os nossos. Bloqueamos os nossos impulsos e necessidades em favor das vontades do outro. Não expressamos a nossa verdade com medo de perder o outro. Se, pelo contrário, as pressões ou o desejo pessoal para a evolução se sobrepõem, optamos por arriscar, realizando mudanças que são movidas, decididas e iniciadas por nós. São mudanças que têm associadas mais dúvidas e incertezas, do que a segurança e solidez, pois o caminho a traçar é novo, diferente do conhecido e experimentado e, consequentemente, mais desafiante. Movemo-nos no sentido de construção da nossa identidade, fortalecimento e crescimento pessoal. Nestas situações agimos. Somos capazes de organizar o tempo em função das necessidades pessoais, de dizer “não” ao outro, de defender princípios diferentes dos que nos foram incutidos. O adolescente é capaz de dizer “não” às pressões dos amigos; a rapariga é capaz de terminar a relação em que sofre e assumir a vida de forma autónoma; a mulher parte para a viagem que necessita, enfrentando o mundo de frente; o homem inicia uma terapia porque sabe que sozinho não é capaz de resolver os seus problemas.
Forte e autêntico. Ter a coragem de arriscar e de enfrentar os obstáculos que esta ação implica é por si só um sinal de mudança, uma certeza de que acreditamos que a vida pode ser diferente. O caminho é pautado por dor ou sofrimento, mas acreditamos que o conseguimos trilhar. É certo que podemos não acertar sempre nas opções que fazemos ou magoarmo-nos com algumas delas, mas sabemos que temos capacidade para realizar as mudanças e tornarmo-nos mais fortes e autênticos. É neste momento que cada um é o verdadeiro ator e autor da sua vida. Na dúvida do que fazer, experimente!