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Finanças conjugais

O dinheiro é frequentemente fonte de problemas entre o casal. Alguns não suportam que o parceiro ganhe mais, outros apontam o dedo por ser demasiado gastador. Trata-se de lidar com questões de poder e controlo da dinâmica familiar, o que nem sempre é pacífico.

Discutir assuntos de dinheiro com o parceiro é um tema que ainda hoje muitos casais evitam. De fac­to, o dinheiro encontra-se inex­trincavelmente associado às es­peranças e sonhos, sentido de se­gurança e de reconhecimento so­cial, medos e crenças pessoais, mas também a quase todas as emoções e expectativas que caracterizam a vida familiar.

Existem três elementos essenciais para que uma relação dê certo e se­ja saudável. A primeira passa pela possibilidade de nos expressarmos livremente acerca da forma como encaramos o mundo e, em parti­cular, a relação. Passa ainda pela segurança física e psicológica da nossa pessoa e dos nossos filhos e, finalmente, pela sensação de con­fiança em relação ao futuro, ou se­ja, ter a possibilidade de sonhar. Em qualquer um destes campos, a última coisa que queremos sen­tir é que precisamos de nos proteger do nosso companheiro. Nesse sentido, o dinheiro gera um con­texto muito potente para que sur­jam mal-entendidos, atraindo ou­tras emoções negativas que geral­mente gravitam no espaço de du­as pessoas.

Contexto social. Há umas de­zenas de anos atrás, a mulher ain­da não estava integrada no merca­do de trabalho como está hoje e, se acontecia trabalhar fora, a última palavra pertencia ao marido. Mes­mo quando o dinheiro era ganho pelo homem e entregue à mulher, ela tinha que prestar contas dos gastos, tornando-se assim res­ponsável pela abundância ou pe­la falta de dinheiro. No tempo dos nossos avós, se a mulher queria ter algum dinheiro para “os seus alfi­netes”, tinha que escondê-lo, ma­quilhar as contas do merceeiro, principalmente quando não lhe era possível pedi-lo abertamente, ou se, trabalhando fora, lhe era so­cialmente exigido partilhar tudo com o marido.

A verdade é que a diferença de sa­lários ainda hoje é motivo de dis­cussão entre muitos casais. Se para uns não tem qualquer importân­cia quem ganha mais, para ou­tros não é bem assim. De um mo­do geral, a vantagem está do lado dos homens, que chegam a ter um salário duas a três vezes mais ele­vado do que o das mulheres. As­sim, a tradição não foi quebrada e a ideia do homem provedor man­tém intacto o equilíbrio emocio­nal individual e da relação. Quando é a mulher que ganha mais, há um aumento na inten­sidade e frequência do número de discussões devido ao dinheiro. Culturalmente, e aos olhos de ter­ceiros, o homem perdeu a capaci­dade para que foi “treinado” por milhões de anos de história. Se ac­tualmente tendemos a não valorizar estes comportamentos e acei­tamos, por exemplo, que cada um tenha a sua conta, mesmo assim não podemos esquecer que somos fruto de um passado que nos le­gou uma herança nem sempre fá­cil de alterar.

Nós e o dinheiro. Aquilo que so­mos actualmente também é resul­tado das vivências, expectativas e crenças que nos foram transmiti­das enquanto crianças, também no que respeita ao dinheiro. Isso significa que o valor que lhe atri­buímos numa relação é determi­nado pela “personalidade finan­ceira” que desenvolvemos ao lon­go do tempo.

A primeira diferença tem a ver com o género. Parece consensual, que as mulheres colocam a segu­rança financeira como uma das su­as principais prioridades. Outras características comuns a homens e mulheres estão presentes em proporções diferentes em cada um de nós e dizem-nos qual o nosso esti­lo de relação com o dinheiro.

O despreocupado vê o dinheiro como fonte de liberdade, não gosta da rotina nem de horários rígi­dos. É geralmente freelancer e acei­ta correr riscos financeiros. Prova­velmente nunca fez um orçamento ou planeou o seu futuro financei­ro. Se lhe sobra, gasta naquilo que lhe dá prazer.

O cuidadoso entende o dinheiro como fonte de estabilidade e segu­rança. Guarda tudo o que sobra do orçamento meticulosamente pla­neado e geralmente é visto pelos outros como o “forreta”.

O dirigente vê o dinheiro como fonte de poder. Gosta de ter con­trolo e gasta naquilo que lhe dá estatuto social, influência e força. Por último, temos o sociável. Uti­liza o dinheiro para reforçar os seus relacionamentos, é cuidado­so na gestão e compra um presen­te a alguém ou recebe amigos em sua casa. Não resiste a estar dispo­nível para os outros e geralmente é o primeiro a “abrir os cordões à bolsa” para terceiros.

Todos nós temos um pouco de ca­da um destes estilos em diferentes momentos da nossa vida e saúde financeira. São estilos em relação aos quais não interessa fazer juí­zos de valor, mas apenas identi­ficar o nosso e o do nosso cônjuge desde o início de uma relação. Trata-se de um passo muito im­portante para estabelecer um pla­no de vida coerente, aprendendo a negociar as diferenças e afastando as questões financeiras do âmbito das discussões.

Partilha e autonomia. Nos ca­samentos actuais assistimos à ma­nutenção de contas separadas e uma terceira para a qual os cônju­ges contribuem a meias, de forma proporcional ao salário ou apenas em função dos acordos pré-esta­belecidos sobre quem paga o quê. A verdade, no entanto, é que casa­mos cada vez mais tarde e muitas vezes trazemos para a relação um historial financeiro de ganhos, dí­vidas e compromissos que passam a ser partilhados.

Independentemente das diferen­ças de salário, de haver muito ou pouco dinheiro, a gestão das fi­nanças no quotidiano é frequen­temente fonte de problemas no casal, uma vez que se trata de li­dar com questões de poder e con­trolo da dinâmica da relação. A manutenção da autonomia de ca­da elemento do casal numa socie­dade em que o nível de divórcios é tão elevado aconselha a que cada um mantenha a sua conta indivi­dual, para além daquela que resul­ta das necessidades do orçamento familiar. Pode parecer-nos uma visão do casamento muito mate­rialista, mas a verdade é que ac­tualmente estamos na era dos ca­samentos negociados, em que te­mos que descobrir como conviver, respeitando sempre as diferenças do outro. Não se trata de adoptar uma atitude individualista, mas apenas de preservar a autonomia necessária para exprimir a nossa individualidade na vida de casal. Se ambos partilharmos os nossos sonhos, onde queremos ir, o que queremos fazer, o que queremos para os nossos filhos, que impor­tância atribuímos às necessidades dos familiares, então podemos es­tabelecer um orçamento que funcionará como guia. A cumplicida­de e capacidade de partilha que es­te processo exige terão como con­sequência maior proximidade dos elementos do casal, melhor solidi­ficação da noção do “nós” e a remo­ção do elemento financeiro da área da discussão para o introduzir na área do diálogo construtivo.

É muito importante que cada ele­mento do casal enfrente os seus sentimentos e crenças acerca do dinheiro e encontre disponibili­dade para discutir as suas finan­ças, tomando decisões em conjun­to acerca de orçamentos, objecti­vos a curto e longo prazo e estra­tégias de investimento.

 

Ajuda:

  • Falar sobre a situação finan­ceira antes de decidir casar. Considerar pagar as dívidas de cada um antes de casar. Conversar acerca de como a questão do dinheiro era vivida nas famílias de origem.
  • Conversar sobre como lida­mos com o dinheiro ou a falta dele no passado.
  • Ser honesto relativamente à situação financeira.
  • Estabelecer objectivos co­muns através de conversas regulares.
  • Desenvolver um orçamento que possa ser sempre revisto face a imprevistos.
  • Decidir antecipadamente qual o grau de endividamen­to aceitável.
  • Atribuir uma verba para as “loucuras” da família.
  • Dividir responsabilidades. Ter um comportamento mo­derado com as finanças indi­viduais.
  • Ter em conta a educação fi­nanceira dos filhos.
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