A pressa é inimiga da perfeição e da nossa saúde. Aceite como um facto consumado do estilo de vida dos nossos dias, pode atingir intensidade que até já é classificada como uma síndrome.
Cada pessoa tem o seu ritmo. Uns são mais lentos, outros mais dinâmicos, mas se a rapidez é tão extrema que qualquer um se torna preguiçoso por comparação consigo mesmo, então essa forma de estar resulta de uma perturbação psicológica e comportamental que atinge cada vez mais pessoas e pode causar não só a perda de qualidade de vida, como também problemas cardíacos, gástricos e outros decorrentes da queda de imunidade do organismo.
Saúde comprometida. A síndrome da pressa foi definida nos anos 5o por dois cardiologistas americanos ao perceberem que os pacientes com problemas cardíacos se podiam encaixar num perfil específico. Assim, determinaram os perfis A e o B. No caso que nos interessa, as pessoas com esta problemática encaixam-se no tipo A e caracterizam-se por serem ansiosas, apressadas, andarem num ritmo rápido, comerem as refeições quase sem dar conta de que o fizeram, comunicarem com os outros com rapidez, economia e com tendência para completarem a ideia do outro para apressar a conclusão. São geralmente hostis a situações que parecem levá- los a perder tempo e têm a capacidade de executar diversas tarefas ao mesmo tempo, exigindo muito de si mesmas.
A saúde destas pessoas geralmente fica comprometida. Estão mais sujeitas a doenças auto-imunes, problemas cardíacos, de pele e de estômago. Existe também uma ligação entre o stress e doenças do foro psicológico, como a síndrome de pânico e a depressão. Estas pessoas não admitem o fracasso, nem o ócio e apenas se valorizam através de feitos realizados. Acabam por se armadilhar a elas próprias, na medida em que também não são capazes de delegar, o que as sobrecarrega ainda mais de trabalho e responsabilidade. A incapacidade de delegar está relacionada à imagem que têm de si mesmas e que lhes mostra que são capazes de fazer tudo mais rápido e melhor do que qualquer outro.
Influência na família. Assim, os portadores da síndrome da pressa acabam por dificultar a convivência com os que estão à sua volta. Por serem impacientes e perfeccionistas, têm dificuldades em lidar com pessoas tipo B – aquelas que conseguem resistir à pressão. As áreas de dificuldade vão desde as amizades, passando pelo campo profissional e até sexual. A família dos apressados patológicos também sofre, na medida em que os ritmos de cada um dificilmente são respeitados. Numa sociedade que se movimenta a uma velocidade meteórica, em que a novidade e a informação são cada vez mais difíceis de apreender e integrar, os pais começam a dar sinais da síndrome da pressa e os filhos têm que fazer o maior número de coisas no menor tempo possível. Hoje em dia um jovem que se mostre contemplativo, que demonstre o gosto pela meditação ou, pura e simplesmente, consiga parar para introduzir um momento de relaxamento no seu dia é, no mínimo, estranho. O normal será estar a fazer alguma coisa! Nunca como hoje se falou em nas questões do prazer sexual. As razões para que isso suceda são muitas, mas uma delas pode estar relacionada com o aumento do número de pessoas que, sofrendo da síndrome da pressa, se queixam cada vez mais da sua incapacidade em sentir prazer nas relações. Na realidade, muitas delas encaram frequentemente o relacionamento sexual como mais uma tarefa em que a boa performance preenche a sua necessidade de perfeccionismo, não se permitindo nem permitindo ao outro desfrutar calmamente do prazer de estar junto.
Slow food. A síndrome da pressa acabou por gerar uma reacção da sociedade. Na Europa de hoje há um movimento significativo, com base em Itália e ramificações na França, Espanha e noutros países, conhecido por slowfood. Os seus seguidores atestam as vantagens de comer e beber devagar, de apreciara preparação dos alimentos, partilhando-os no convívio dos amigos ou da família (sem televisão). Mas este movimento transcende a comida, tentando promover um estilo de vida mais tranquilo. A base desta nova forma de estar está em questionar a “pressa” e a “loucura” geradas pela globalização, através do apelo consumista, por oposição à qualidade de vida e à qualidade do “ser”.
Parar. Não é fácil lidar com pessoas que sofrem da síndrome da pressa. Contudo, se elas forem capazes de aceitarem que são vítimas desta perturbação, então a forma de estar das pessoas tipo B, em que predomina a calma e a planificação com uma hierarquia de prioridades centrada nas suas necessidades, também pode ser contagioso. Contudo, o objectivo não é que a pessoa tipo A se transforme numa do tipo B. Importa é que estas pessoas sejam capazes de parar e compreender os motivos que geram este comportamento, e não esperar que a doença se instale para reduzir a velocidade e redefinir as prioridades e objectivos.
Parar permite-nos cultivar o afecto nos relacionamentos por oposição à funcionalidade, permite-nos conversar, ouvir e conhecer o outro. Se tivermos que lidar com alguém tipo A, a estratégia passa por não desistir e tentar opor a qualidade à quantidade e a velocidade à persistência.